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Famosos entrevistam Fernando Montenegro: "Que emoção"

fernanda (Foto: Marcelo Correa)

A convite de QUEM, diversas personalidades do meio artístico brasileiro aceitaram entrevistar Fernanda Montenegro . Nomes como Jô Soares, Bibi Ferreira e Luís Fernando Veríssimo, entre muitos outros, propuseram questões de todo tipo: da experiência de seus 63 anos de carreira até curiosidades do dia a dia. A atriz, que acaba de completar 84 anos, fez questão de responder a todos e se disse tocada com a homenagem. “Que emoção, é muito carinho”, afirma ela, que desconstrói os rótulos que lhe dão. Inclusive o de “grande dama” do teatro. “Não existe ‘grande’ nem ‘dama’. É horrível, parece um epíteto, um beira-túmulo do tipo ‘aqui jaz uma grande dama’”, diz, com humor e humildade.


Viúva há cinco anos do ator e diretor Fernando Torres, com quem foi casada por 56 anos, a atriz teve dois filhos, o diretor Cláudio Torres, 49, e a atriz Fernanda Torres, 48. Tem três netos: Davi, 13, do casamento de Cláudio com a atriz Maria Luiza Mendonça; e Joaquim, 14, e Antônio, 4, de Fernanda com o diretor Andrucha Waddington.


Após se despedir da novela Saramandaia, Fernanda está em cartaz em teatros populares do Rio de Janeiro, onde mora, com a peça Viver Sem Tempos Mortos. No cinema, lançou O Tempo e o Vento, de Jayme Monjardim. Filma, ainda, O Fundo do Lago Escuro, de Domingos de Oliveira, e participa de um curta do genro, Andrucha. Deste mês até março, grava a série Doce de Mãe, da TV Globo, e, no segundo semestre do ano que vem, fará a direção e o roteiro de uma adaptação de crônicas de Nelson Rodrigues para os palcos. “Fique tranquila, que ela vai dar conta de todo esse processo de trabalho brutal”, responde, a seguir, a incansável Fernanda, referindo-se a si mesma, quando ouve a pergunta (“Como vai você, mamãe?”) feita por sua filha.


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

Fernanda Torres

Como vai você, mamãe?

Fernanda Montenegro:
Sua mãe vai muito bem, minha filha (risos). Fique tranquila, que ela vai dar conta de todo esse processo de trabalho brutal que segue até março. Naturalmente, vamos arrumar algum tempo para nos ver. Vamos nos falando duas ou três vezes por dia, como sempre. Vamos encontrar uma horinha para ter um almoço de família. Agora, ao fazer cinco anos de falecimento do seu pai, nos vimos na missa que mandei rezar para ele. Nas férias de final de ano, viajaremos para algum lugar juntos. Alguma hora dessas, voltamos a nos encontrar no teatro ou no cinema, também.


Jacqueline Laurence

Fernanda, nossa vida foi alimentada por sonhos, acho que isso é tão verdade para mim quanto para você. Apesar de sabermos bem o que cada uma pensa, tenho uma curiosidade: qual é o seu sonho? Gostaria muito de saber, porque é sempre um prazer enorme falar com você.

FM:
O meu sonho, querida amiga, é ver meus netos adultos.


Marília Gabriela

Quando fica cansativo ser Fernanda Montenegro?

FM:
Sei exatamente a hora que tenho que abrir mão da privacidade e ir à luta. Não me esgoto, vou até onde posso ir. Não abro mão disso. Talvez aí esteja a longevidade de aguentar o trabalho com o público, com a comunicação, que é tão brutal.


Irene Ravache

Fernanda, minha querida, minha ídola, do que você tem medo fora e dentro do palco?

FM:
Ah, tenho medo das perdas seguintes: memória, visão e a decadência física. Medo de me desconstruir, dos esgotamentos que vêm com a idade. Mas nada é pior do que ficar sem memória.


Rita Lee

La Montenegro, você tem um santo de devoção?

FM:
Tenho a minha Nossa Senhora, minha Santa Mãe Santíssima. E, de vez em quando, grito “Jesus”!


Marcello Antony

Nanda, são muitos anos de entrega total à profissão e à família. Amadurecimento e sabedoria andando lado a lado. Nessa retrospectiva de vida, qual o sentido dela para você?

FM:
É estar viva. Um dia, a gente abre o olho e está neste planeta. Não sei qual é o meu tempo de vida, mas já que bati aqui, e tenho um caminho a seguir – até quando queira Deus, uma entidade, meu organismo, sei lá –, até lá, acordo todo dia e estou viva. Salve seja (ela bate três vezes na madeira)!


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

Ricardo Linhares

Querida, no intervalo entre trabalhos, você gosta de viajar para espairecer ou prefere ficar no Rio, retomando a rotina? Que tipo de destino você prefere?

FM:
Quando a gente vem de uma rodada de trabalho muito violenta, quer ir para casa ficar quietinha. Nos nossos primórdios, com crianças pequenas, descobri a Patagônia. Íamos sempre para o sul da Argentina, tipo Bariloche, El Calafate, é uma região muito bonita e pouco explorada, lugar de grande paz. E sempre vou a Paris, à Itália, por questão cultural do meu lado materno, a Portugal... Queria explorar o interior da Inglaterra e a Rússia com mais calma. Só conheço São Petersburgo.


Bibi Ferreira

Com essa vida atribulada de trabalho, você ouve música? Que gênero?

FM:
Ouço todo tipo de música, Bibi, querida. Tenho música no closet, no banheiro, no carro. Não sei viver sem música. O grande momento ao qual o ser humano chegou vem da música. Vou dos clássicos ao samba de roda. Sem preconceito em matéria de música. Pode vir da Idade Média, da Palestina... De Villa-Lobos, Beethoven, Carlos Gomes... Gosto de ópera, de música popular brasileira, de tudo que diz respeito a qualquer velha guarda de qualquer escola de samba.


Glória Maria

Sou encantada por você, Fernanda. Tenho muita coisa para te perguntar... O que você usa como lição de vida que o tempo e a experiência tenham ensinado? Você é uma mulher que, em qualquer circunstância, vê graça na vida. De onde tira esse humor para viver? Como consegue deste mundo tão absurdo extrair humor, ver graça e ter essa força?

FM:
É paciência (risos). Só paciência! Da paciência vem o humor, vem condição para suportar o entendimento com o outro.


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

Zuenir Ventura

Fernanda, querida, qual é a receita para sua invejável vitalidade física e mental?

FM:
Estamos pau a pau nisso! Não conheço ninguém que produza mais do que você, com uma gentileza e humanidade que tocam qualquer um. É um referencial do nosso jornalismo.


Jô Soares

Como você consegue ser tão autêntica, tanto na vida como no palco?

FM:
Jô, como é que seria diferente? Deve dar um trabalho estranhíssimo não ser você mesmo a vida toda. Mesmo quando você está no seu mais íntimo, sozinho no banheiro, se espremendo todo, alguma coisa ali sai autêntica (risos).


Jorge Fernando

Qual é seu segredo para manter a chama viva do ator e a criança brincalhona, como você faz e fez brilhantemente durante toda a sua carreira?

FM:
Olha, Jorginho, que coisa! Você é uma resposta para essa pergunta. Não conheço ninguém mais vibrante, mais crente, mais vivo, mais amoroso e de bem com a vida do que você. Então, tenho que aprender com você. Ainda não alcancei na minha idade o estágio em que você, na sua, chegou.


Claudia Raia

Como conseguiu ser esse monumento de mulher, tanto na vida profissional quanto na pessoal, sem deixar de lado a humildade e o carinho que transmite a qualquer um que chegue perto de você?

FM:
Não sei, Claudinha, não sei. Como posso responder a essa pergunta? Você está na vida, quando jovem, achando que terá um caminho para qualquer lugar. Aos poucos, aprende que esse caminhar pode terminar agora ou daqui a 80 anos. Nada é sólido neste mundo, nada tem compromisso com o eterno. Essa instabilidade de que tudo isso aqui é uma ilusão, que pode terminar agora, não pode nos dar arrogância ou pretensão de eternidade. Todo dia, luto para sobreviver àquele dia, com todas as carências normais ao ser humano. No final do caminho, a morte vai te buscar de qualquer maneira.


Nathalia Timberg

Nossa língua é tão rica, belíssima! Você acha que em breve terá o destino do latim e do grego?

FM:
A nossa língua corre o perigo, minha querida companheira de anos e anos de palcos e TV, de virar um dialeto. Se não acordarmos, estaremos para sempre confinados a esta América do Sul. Não temos o reconhecimento no exterior do que somos como língua, escritores, poetas. Ficamos confinados ao nosso país.


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

Astrid Fontenelle

Como essa persona que é Arlete (nome verdadeiro da atriz), mas que é também a dama Fernanda Montenegro, completaria a frase: “Jovens, por favor....”. Aliás, aproveito para dizer que me esforço diariamente para ser um pouco a Fernanda Montenegro da apresentação de programas. Sou louca por você!

FM:
Arlete é o esteio da dona Fernanda. É uma senhora que, no fundo, no fundo, sou eu. Ela não é uma ilusão, é o ser humano que eu sou. É a senhora que comanda minha vida, meu gosto, meu corpo, meu coração. Dona Fernanda Montenegro é algo que aconteceu a minha revelia, numa dimensão que nem existe como aparenta para alguns. Já sobre a frase... Jovens, por favor, procurem ler. Segurem um livro, entendam o que é sentir o cheiro do papel, o que é voltar uma página. Talvez vocês estejam interessados em bolinar um aparelhinho, mas voltem no tempo de Gutenberg (inventor e gráfico alemão), e, por favor, segurem um livro amorosamente sobre o peito enquanto dormem.


Gerald Thomas

O mundo fica mais chato com a internet?

FM:
Fica. Fica porque as pessoas não buscam o outro na sua dimensão carnal. A gente não precisa mais beijar, abraçar, dar a mão, é tudo interferência mágica de ondas descarnadas.


Fernanda Machado

Você é uma grande atriz, de carreira brilhante, que chegou aonde poucos chegaram, sua história é impecável e inspiradora, inclusive para mim. Quero muito saber se alguma vez houve conflito em administrar sua carreira com a vida pessoal, visto que você também tem uma família brilhante. Não é fácil, eu sei disso.

FM:
O começo foi complicadinho, porque a família não entendia essa profissão estranha. Mas nunca fui uma mulher de barulhos revolucionários. Sou de fazer revolução sem histeria. Fui mostrando para meus pais que esta é uma profissão como outra qualquer. E eles viram que eu não estava brincando. Logo conheci Fernando, nos juntamos, casamos, e aí a vida veio junto.


Francisco Cuoco

Depois de “tudo”, queremos sempre trabalhar. Estamos sempre aprendendo. Teatro, cinema, televisão... Somos movidos a paixão. Estamos sempre num clima de “assim é se lhe parece”. Nossa maturidade responde com um “pode ser” ou “talvez”. Tudo passa tão depressa! As coxias, a plateia, as correntes de ar do saguão, os textos rabiscados, as histórias que a gente escuta... A vida. Você também pensa assim?

FM:
Completamente. Vi você, Cuoco, estreando na (peça) A Muito Curiosa História da Virtuosa Matrona de Éfeso, quando você tinha uns 26 anos, tinha acabado de fazer a escola de Alfredo Mesquita, em São Paulo. Temos uma longa vida trabalhando juntos. Estar com você é estar com minha própria história. É uma das tantas testemunhas do que (nós, artistas) já fizemos vida afora.


José Mayer

Queridíssima Fernanda, grande mestra, com quem aprendi e me diverti tanto nas gravações de Saramandaia, houve um fato ou pessoa que tenha sido determinante para que você escolhesse a profissão de atriz? Ou foi um processo elaborado aos poucos, através de repetidas decisões?

FM:
Meu filho, Zico Rosado (personagem de Mayer na novela)! Houve o cinema. Desde os 3 anos, eu ia para o cinema no colo da minha mãe ou levada pelo pai. Cinema era uma grande fuga ou descoberta do que é possível como imagem, como sonho. Sou uma “cinemeira” doente. O mundo da criatividade me veio através do cinema.


Aracy Balabanian

Fale um pouco da importância de seu casamento com Fernando Torres para o teatro e a televisão e do “terceiro filho” de vocês, o Teatro dos Sete (companhia de teatro fundada em 1959 por Fernanda, Fernando Torres e outros colegas, que funcionou até 1965). E, aproveitando, quando vamos sair para jantar de novo?

FM:
Aracy, só depende de você. Sempre que falo com você, está ocupada! A hora que quiser me convidar para jantar, fique certa de que eu vou! Minha história com Fernando é de 60 anos de luta sobre os palcos, onde realizamos alguns dos espetáculos mais bonitos e com mais público presente que o teatro brasileiro poderia ter no século passado. Falo isso sem pudor. Com Sergio Britto e Ítalo Rossi, fizemos peças antológicas. Tudo feito indo a banco, empenhando bens, nos endividando, com uma plateia que pagava, que lotava as salas... Vivíamos só com o que vinha da bilheteria, pagávamos nossas dívidas com o que ganhávamos... E assim foi por mais de 30 anos!


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

Bárbara Paz

Nossa! Falar com a Fernanda Montenegro é uma honra e pensar em apenas uma pergunta fica difícil, mas vamos lá. Sendo o meu espelho de trabalho, gostaria de saber o que mais te motivou a continuar na carreira de atriz?

FM:
Estar viva. Olho para você e vejo como é uma atriz extremamente entregue a uma fúria de ser íntegra no que escolheu fazer. Você é um talento que vejo pleno, tanto na TV quanto no teatro.


Naldo

Além do seu enorme talento, a que você atribui a estabilidade que conquistou na sua carreira? Se pudesse voltar atrás, mudaria alguma coisa?

FM:
Não mudaria nada, porque não esperava nada disso. Esperava ter um ofício, não vim na ilusão da arte. Encarei isso como profissão, por mais que não goste do tom de quem professa que a palavra dá. Me envolvi desde cedo com a música. Talvez no passado eu tivesse gostado de ter sido uma cantora lírica popular. Mas não se preocupem, não vou insistir em cantar agora (risos).


Gilberto Braga

Fernanda, dos inúmeros personagens que você criou magistralmente, meus preferidos são a Zulmira, do filme do Leon Hirszman A Falecida, e Clotilde Dubois, do Henry Becque adaptado pelo Millôr em A Mulher de Todos Nós. E você, algum personagem a toca de uma forma mais profunda?

FM:
Meu amigo Gilberto, a vida me deu a oportunidade de fazer muitos personagens que me tocam. Entre a galeria imensa de personagens que tenho, destaco a Chica Newman, da novela Brilhante (1981), que fiz com você. E não estou falando isso para ser simpática, é que foi um trabalho muito bonito e com grande aceitação de público. Já, no teatro e no cinema, ficaria triste de destacar um só. A gente faz tudo com tanto sacrifício, não seria justo...


Jayme Monjardim

Passados quase dez anos desde Olga (2004), nos reencontramos em O Tempo e o Vento. Você está cada vez mais plena, uma atriz com quem todo diretor sonha em trabalhar. No seu ofício, o que mudou neste tempo?

FM:
Foram mais dez anos de trabalho, mais dez anos de experiência, de sobrevivência. Isso traz amadurecimento. Há 20 anos, não via o mundo como eu vejo hoje.


Tammy Di Calafiori

Qual é o seu critério para escolher um papel? Isso mudou com o tempo?

FM:
Vou te dizer uma coisa que é estranha. Me oferecem coisas que não posso deixar de aceitar. Recebo convites que não tem o que pensar, tem que ir. Tenho o privilégio na vida de aceitar convites, até porque não batalho pelos papéis, eles simplesmente vêm. Assim é até hoje. Não tenho a experiência de bater à porta, de pedir trabalhos. Por isso, não tenho condição de dizer não para nenhum. Dou um jeito.


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

Edney Silvestre

Sei que há algo que a irrita, algo que fãs e admiradores fazem com frequência, e que você se contém para não dar uma resposta ríspida, Fernanda. É quando a chamam de “grande dama”, seja do teatro, da TV ou do cinema. Por que “grande dama” a irrita tanto?

FM:
Porque não existe “grande” nem “dama”. É horrível, parece um epíteto (risos). Parece um beira-túmulo, do tipo “aqui jaz uma grande dama”.


Luiz Fernando Guimarães

Fernanda, li em algum lugar que você é boa de garfo, adora comer e que não entra em cena ou sobe no placo com a barriga vazia. É verdade?

FM:
Meu querido Luiz, já fui voraz. Mas hoje me sinto quase curada. Talvez eu tenha uma energia que me consuma muito. Gosto de comer coisas salgadas antes de entrar em cena. Se não me alimento com alguma coisa, no meio da peça vou ter um tremor. Então, me preparo. Já quis bancar uma pessoa sublime que vai criar sobre o palco, com estômago vazio, para que a sensibilidade invada a alma, mas não dá certo (risos). Aí, a Arlete sente fome e o organismo pede sal.


Luís Fernando Veríssimo

Fernanda, tirando as brasileiras, para não dar ciúme, qual é a sua atriz favorita, de todos os tempos?

FM:
Bette Davis. Hollywood não teve nenhuma atriz melhor antes ou depois de Bette Davis.


Diogo Vilela

Fernanda, nossa amada atriz, você sente vontade de fazer teatro? Gostaria de vê-la em cena em breve! Um beijão, sou seu grande fã.

FM:
Fiz três temporadas longas de Viver Sem Tempos Mortos, em São Paulo. Quero retomar a peça, depois do Méier e da Penha (no subúrbio no Rio), numa temporada na Zona Sul também. Estou filmando O Fundo do Lago Escuro, de Domingos de Oliveira. De outubro até março, faço Doce de Mãe, na Globo. Tem ainda um curta com Andrucha Waddington... Farei roteiro e direção de crônicas de Nelson Rodrigues adaptadas para o teatro no segundo semestre do ano que vem. É um bloco de trabalho tão grande que fico cansada só de anunciar.


fernanda (Foto: Marcelo Correa)

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